Carnaval com Lilith

Neste Carnaval passaremos com Lilith em Sagitário indicando que os excessos serão grandiosos durante esta festa da carne. Exageros sexuais, muita bebida, além de atrevimento, desinibição, disposição e otimismo serão as maiores características desse período. O verdadeiro problema deste carnaval será que ao fim, quando a Quarta-feira de Cinzas chegar, todos serão obrigados a reconhecer que a realidade não tem nada a ver com os últimos dias de festa.

Mas quem é Lilith? Na astrologia, Lilith não é um astro real, mas sim um ponto na trajetória da Lua. Ela representa o ponto de maior distância entre a órbita lunar e o planeta Terra, ou seja, seu apogeu. O ponto em que a Lua parece ser menor do que realmente é. Ela portanto faz parte da Lua e de seu universo lidando com sentimentos e emoções.

Lilith é um dos poucos signos astrológicos dos quais estamos tratando aqui que não tem ligação com a tradição mitológica grega. Lilith faz parte da tradição de astrólogos judeus que a introduziram no conhecimento astrológico a partir da Idade Média. Ela foi a primeira mulher de Adão. A referência mais antiga que temos sobre ela advém do Alfabeto de Ben-Sira, composto por volta de 700 a.C., durante o período de cativeiro dos hebreus na Babilônia. Por causa dessa referência, acredita-se que Ben-Sira tenha se apropriado dos demônios mesopotâmicos, Lilitu, para compor a imagem de Lilith. Estes seriam demônios dos ventos e das tormentas, em geral femininos, mas também aparecem como masculinos, que a noite invadiam os quartos dos homens para ter sexo com eles [1], estes tem sua referência mais antiga na Epopeia de Gilgamesh, em 2000 a.C. [2].

Na Bíblia que nos foi legada, que é uma construção medieval, só existe uma referência direta a Lilith, em Isaias: “E gatos selvagens se encontrarão com as hienas; e o sátiro clamará ao seu companheiro: e Lilith ali pousará, e acharão um lugar de repouso para si” [3]. Porém Janet Gaines faz uma ressalva. Em Gênesis diz-se: “E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; macho e fêmea os criou” [4], a historiadora bíblica argumenta que no primeiro capítulo da Bíblia, quando Jeová começa a criação e encerra-a criando os seres viventes e os homens à sua imagem e semelhança, ele cria macho e fêmea, homem e mulher. Somente no capitulo seguinte que Deus, percebendo que não era bom para o homem permanecer só, cria uma nova mulher. “E da costela que o senhor Deus tomou do homem, formou a mulher: e trouxe-a a Adão. E disse Adão: esta agora é osso dos meus ossos e carne da minha carne” [5]. Gaines aponta para o fato que Adão diz que “esta agora é” oriunda dele, pressupondo que haveria uma outra mulher que não fora criada de seus ossos e carne. Porém a maior fonte sobre Lilith ainda são os versos de Ben-Sira a Nabucodonosor. Segundo o poeta hebreu Lilith foi criada a partir do barro e Deus soprou-lhe vida, tal qual Adão. Criada em igualdade, reivindicou o mesmo tratamento que era dada ao seu irmão e marido. “Lilite disse: ‘Por que devo deitar-me embaixo de ti? Por que devo abrir-me sob teu corpo? Por que ser dominada por ti?”. Adão retrucou: “ ‘Eu não vou me deitar abaixo de você, apenas por cima. Pois você está apta apenas para estar na posição inferior, enquanto eu sou um ser superior.’ Lilite respondeu: ‘Nós somos iguais um ao outro, considerando que ambos fomos criados a partir da terra’. Mas eles não deram ouvidos um ao outro. Quando Lilite percebeu isso, ela pronunciou o Nome Inefável e voou para o ar. Adão permaneceu em oração diante do seu Criador: "Soberano do universo! A mulher que você me deu fugiu!", abandonando o Éden.Adão queixou-se a Deus e este enviou três anjos – Sanvi, Sansanvi e Samangelaf – para trazê-la de volta. A operação é um fracasso, porém Lilith promete a estes três anjos que onde ouvisse seus nomes ela não faria mal a ninguém. 

Prevendo que outra mulher criada do barro pudesse agir como Lilith, Deus cria Eva agora da costela de Adão, para que esta se submeta a ele. A frustração de Lilith pela igualdade e a frustração de Adão para trazê-la de volta são os primeiros elemento do mito que conectam-se ao signo. Lilith para a astrologia é o signo que revela nossas frustrações. As experiências que nos geram grande expectativa, porém tendem a agir de forma dimetralmente oposta ao que esperamos. Ele representa a nossa insatisfação com a nossa situação, que no entanto é impossível de ser melhorada, e só poderá ser resolvida quando se desiste completamente daquela necessidade que o próprio signo também indica. Lilith abandona o Éden, abandona seu sonho de igualdade, e Adão desiste da primeira esposa e recebe Eva em seu lugar.

Longe do paraíso, Lilith é seduzida pelo príncipe dos anjos decaídos, Samael, e torna-se a partir daí a rainha demônio. Sedutora, transforma-se em coruja e ataca os homens que dormem sozinhos, ela precisa de seu sêmem (que consegue através das poluções noturnas) para que tenha os seus filhos demônios. Aqui a referência relacionada a sexualidade que este signo representa é clara. Lilith é o signo da sexualidade humana, de como a vivemos e como nos relacionamos com esta parte de nossa vida.

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[1] ESOPINHO. Dicionário de mitologia nórdica.

[2] Nos Pergaminhos do Mar Morto, comentários apócrifos sobre o Talmud e o Pentateuco cristão, retoma a imagem de Lilith, sempre aproximando-a dos lilitu.

[3] ISAIAS, 34:14. (Tradução do autor porque na maioria das traduções a palavra לילית, Lilith, é traduzida como “a coruja”, na tradução portugesa de João Ferreira de Almeida, feita ainda no século XVIII, e ainda a mais utilizada nas Bíblias em português traduz-se a palavra apenas como “animais noturnos”, tradutores judeus costumam utilizar modernamente a expressão “monstros noturnos”, mais informações em GAINES, Janet Howe. Lilith: seductress, heroine or murderer? Disponível em http://www.biblicalarchaeology.org/daily/people-cultures-in-the-bible/people-in-the-bible/lilith/, consultado em 02/12/2016).

[4] LIVRO DO GÊNESIS, 1:27.

[5] Idem. 2: 22-23. Grifo nosso.